quinta-feira, 23 de maio de 2019

Viver Além da Vida

Erros que me assombram — que me intimidam — vêm detrás para pesar-me. Fiz-me inamável e tanto fui amado, ou me imaginava tal. Tenho meus objetivos e planos, mas meus sonhos, tão ao meu alcance, teimo serem inalcançáveis. Há sonhos que não mereço, recompensas que já não mais busco. Nunca tornei-me meio homem, sempre o fui, e passei pelos processos mais duros para sê-lo inteiro então. Estou aqui, e os sonhos não quero, pois é demais tarde.

Aprenda: ande devagar, fale devagar. Pause e dê tempo para que seus pensamentos ganhem chão até a boca. Dominância está na segurança, e segurança está no controle, e controle na serenidade. O saber é sereno, não exasperado. Lembre-se: ande devagar, fale devagar. Saiba onde encontra-se, e nunca precisará encontrar-se em nenhum lugar.

De que serve a pressa? A que perseguimos dia e noite e nos tira o sono e o prazer do surreal que nos decai com a cabeça à cama. De pouco serve aqui. Impaciência é medo, é submissão à fraqueza e pressão. Não há pressa para viver todos os dias; deve haver calma para construirmos, existirmos durante os dias que não teremos chance de viver. Isso é tradição.

Quando encontrei-a, perambulava em devaneio, interpretando auto-destruição como interpreta-se experiência. Vá devagar. Somos gotas num oceano. Prazeres e satisfações não são combustível, nem sequer objetivos maiores. Sua sede de conhecer o mundo é uma sede de conhecer-se, talvez por não carregar autoridade em praticar introspecção, talvez por não verdadeiramente encontrar personalidade no eu.

Há um mundo fora e um mundo dentro. Os mundos que mais importam que conheça encontrará olhando em si e ao redor. Além desse perímetro, julgue como onanismo fútil, do hedonismo mais cru.

O que lhe conecta ao solo da sua terra? Onde está sua continuidade, do passado e ao futuro? O que lhe ressurge seus ancestrais? Onde encontram-se os elementos de seu atavismo? Porque a modernidade torna-nos ocos, e buscamos na superfície a resposta para um novo tipo de homem. Porém, aos homens existe somente biogênese desde o primeiro, e será assim até a Eva do final dos tempos. Nada em ti vem do que já não viveu, e quão doce é esta verdade!

Se é jovem, pare e aprenda. Ande devagar, fale devagar. Vá devagar. Somos gotas num oceano. Não apresse-se. Não alimente-se do hedonismo, já que ele não alimenta. Amor não é a única coisa que há, e pouco amor se encontra nas flores que lhe oferecem. Fiz-me inamável pois não parei e aprendi, fiz-me meio homem assim. Reanimar-se desse modo não é tão simples quanto parece.

Busque tradição nas ruínas.

3 comentários:

Anônimo disse...

Senti saudades de visitar esse lugar. Ler (e reler) seus textos me traz nostalgia e paz ao mesmo tempo, sobretudo nestes últimos tempos, em que amanheço cinza. Também sigo na busca de amadurecer e equilibra-me, sem afogo, um passo de cada vez. Ou tento.

Espero que esteja bem e feliz. Saudades da sua amiga M.

macdemarcela disse...

Senti falta das suas palavras. Eu estou tentando te achar pela internet mas esse parece ser o último resquício da sua presença na minha vida.

Eu espero que algum dia possamos nos encontrar de fato, eu tenho tanto a compartilhar contigo, tanto a conhecer sobre você.

Tenho um enorme apreço por você e por tudo que compartilhamos num espaço de tempo tão curto.

Da sua breve amiga.

Anônimo disse...

Faço do comentário acima minhas palavras. Quão confortante é vir reler esses belos textos que nos fazem refletir.
Espero que esteja bem.